Cinema: A Erva do Rato

Último filme de Julio Bressane impressiona pela beleza incômoda

Júlio Bressane

Júlio Bressane segue fiel à marginalidade. O gosto amargo que amianto seduz em suas películas corre longe do vagão maquinário da indústria. Em direção quase sempre perpendicular e composta por quadros vagos, parados, extrapola uma beleza radiante.

É louvável o modo com que o diretor utiliza de artifícios toscos para gerar sensações de estranhamento. No seu caso a simplicidade roça com a boca aberta a natureza e se orgulha disso. Dando ao espectador prazer indizível.

Inspirado em dois contos de Machado de Assis, ‘A Erva do Rato’ é obra-prima da safra recente de um dos principais nomes do cinema marginal brasileiro. Selton Mello e Alessandra Negriniobjetam o casal anti-convencional da trama. Com que dialogam sempre precedendo falares rebuscados a iniciativas entreabertas e entrecortadas da palavra. Narrações inusitadas dão o choque crônico.

Planos pouco usuais e uma trilha sonora primorosa arredondam os contornos auspiciosos que envolvem os dois personagens. Sons de aspereza torturante contemplam as cores que vivas se entrelaçam ao ser sob quais jogam as tintas. Serras invocam-se através da música instrumentalista de Guilherme Vaz, em suas próprias palavras: “E não comportam interpretações.”

O amarelo ocre do qual compartilham a cena como convidados o rosa desbotado, o vermelho forte e o azul esverdeado, dá o tom do ridículo humano espalhando-se em atos estúpidos e medíocres. Mas há uma incrível misericórdia com que Bressane acolhe a mesquinhez humana, pois merece incontestável elogio. A fotografia estonteante é de Walter Carvalho.

Com sua mistura de gravidade dark e humor paspalhão, remexida em caldeirão de surtos de insanidade, o grotesco e o sublime enamoram-se: o abominável emerge em fôrma de rato.

Sinestésico, aflitivo e macabro, Júlio façanha um surpreendente final, mérito de enredo arraigado em tulipas e ervas daninhas: todas ervas dos ratos.

Cinema brasileiro

Raphael Vidigal

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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